Num momento em que, mais uma vez, em função dos últimos
acontecimentos ligados a crimes violentos cometidos por menores de idade, a
sociedade discute a redução da maioridade penal, cabe aqui colocar como o
Estado, em conivência com a própria sociedade, descumpre com a obrigação de
garantir os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes,
principalmente, aqueles que esta redução objetiva atingir. Ninguém desconhece
os problemas vividos pelos menores pobres e marginalizados em todo o país. O
silêncio e a tolerância à falta de escolas e assistência de saúde, à exploração
do trabalho infantil, aos abusos sexuais e violências domésticas por ação da
família e omissão de todos é inversamente proporcional à exigência de punição e
castigo quando crimes são cometidos, mesmo levando-se em conta a chamada
situação de risco na qual estas crianças e adolescentes estão inseridos. Sem
entrar na polêmica da questão, o poder público, o Estado e a sociedade como um
todo fecham os olhos para a insegurança social que esses jovens vivenciam e até
mesmo para os assassinatos dos quais muitos são vítimas, principalmente nas
grandes cidades, onde o tráfico, a milícia e a própria polícia se encarregam da
maior parte da violência sofrida por seus habitantes.
É neste contexto que a Secretaria Municipal de Educação
reformula a proposta de horário integral nas Escolas do Amanhã, unidades
situadas no que a SME chamou de áreas conflagradas, que funcionavam até as
16h30, e cria o TURNO ÚNICO, onde os alunos têm aulas apenas até as 14h30. Na
prática, é o fim do horário integral nas Escolas do Amanhã. Mais uma vez, a
ação de instituições e estruturas públicas, em comunidades que pouco as
usufruem, ainda é mais subtraída. Com o Turno Único, a SME disfarça que cumpre
o horário integral e, na verdade, diminui o tempo de atendimento dos alunos das
Escolas do Amanhã, deixando as crianças de várias comunidades carentes
vulneráveis a todo tipo de abordagem negativa, muito presente mesmo nas áreas
“pacificadas”. Mais uma vez, os menores pobres e marginalizados, filhos dos
trabalhadores deste município, são abandonados pelo poder público e só podem
contar com os poucos recursos estruturais de suas famílias, que não têm
condições de oferecer, como a escola ainda oferece, a socialização, o acesso aos
conhecimentos historicamente valorizados, a ampliação do capital simbólico, a
apropriação dos diferentes códigos e linguagens do mundo, o desenvolvimento de
um olhar sensível, crítico e criador para uma inserção diferenciada dessas
crianças numa sociedade que tanto precisa de transformação. Sem o horário
integral, a grande maioria desses alunos vive experiências nada facilitadoras
da aprendizagem, muitas vezes sozinhos ou com seus irmãos porque, na melhor das
hipóteses, seus pais estão trabalhando.
Até quando a sociedade vai fingir que não vê aquilo que grita
aos seus olhos, só para se sentir mais à vontade de continuar cega?
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